Slow Fashion: A alternativa sustentável para a indústria da moda

A indústria da moda dita frequentemente novas tendências e coleções que alimentam o consumo em massa do famoso “Fast Fashion”. Esse modelo surgiu na década de 70, no momento em que a mão de obra e a matéria-prima se tornaram mais acessíveis. A partir disso, lojas de departamento invadiram o mercado têxtil trazendo peças mais baratas para os consumidores.

O baixo custo dessas peças traz grande impacto para o meio ambiente, pois, quanto mais é consumido, mais é descartado. A cada nova estação as vitrines se renovam, com coleções mais atuais que despertam o interesse do consumidor.

Um estudo feito em 2019 pelo Boston Consulting Group, chamado Pulse of the Fashion Industry, mostra que até 2030 a indústria global de vestuário terá crescido 81%, chegando a 102 milhões de toneladas de roupas e acessórios, exercendo uma pressão sem precedentes sobre os recursos do planeta. Segundo a Associação Brasileira de Indústria Têxtil (ABIT), o setor da moda gera 175 mil toneladas de resíduos têxteis por ano no país, só em 2021 foi produzido 2,16 milhões de toneladas. Essa quantidade sendo descartada de forma inadequada, afeta diretamente o meio ambiente.

Ainda de acordo com a ABIT, o Brasil é a maior cadeia têxtil do Ocidente. Produzindo matéria-prima, plantação de algodão, tecelagens, confecções e sendo um forte varejista.

“Os materiais têxteis demoram muito tempo para serem decompostos no ambiente e, ao longo, do seu processo produtivo e lavagem desses tecidos para deixar com as tonalidades desejadas, há um gasto enorme de água”, explica Flavia Targa, doutora em Ciências Ambientais.

A especialista ainda ressalta que a própria produção do algodão apresenta um alto gasto de água para a produção dessas peças. Inclusive, pesquisas indicam que as roupas de algodão demoram entre 10 a 20 anos para se decompor, enquanto os tecidos sintéticos levam de100 a 300 anos e o poliéster até 400 anos.

Deserto do Atacama, Chile, em novembro de 2021. Imagem: Martin Bernetti via Getty Images.

A empresa de inteligência de mercado Plastic Insights, reportou que em 2016 o poliéster respondeu por 55% do mercado global de fibra, seguido pelo algodão com pouco mais de um quarto do mercado. Além disso, a Ocean Conservancy afirma que a cada ano 8 milhões de toneladas de resíduos plásticos entram nos oceanos, ocasionando grandes mudanças climáticas, prejudicando a vida marinha e gerando uma grande emissão de carbono na atmosfera. Assim, a indústria da moda é considerada a segunda maior poluente do mundo, perdendo apenas para o setor petrolífero.

Ao contrário do consumo desenfreado, o “Slow Fashion” é uma alternativa sustentável à produção em massa. Os resíduos têxteis descartados de maneira correta se tornam matéria-prima para a produção dessas peças, valorizando cada etapa do processo confecção.

De acordo com a doutora em Ciências Sociais e especialista em Moda Sustentável, Lilyan Berlim, o Slow Fashion é uma alternativa responsável no atual momento em que vivemos.

“Ele super contribui no sentido que difunde uma ideia de uma moda sustentável de verdade. Sendo que eu faço uma observação, nenhuma atividade humana no mundo capitalista é 100% sustentável, mas ele tem uma proposta para o futuro de longo prazo que traz conscientização. Essa conscientização vai no sentido de alterar a cultura de moda do consumidor e também a cultura empresarial de quem trabalha com moda, entender como que a gente pode chegar no futuro, preservando os recursos para as próximas gerações”, explica a especialista.

“A gente não consome roupa, a gente consome moda”, afirma Lilyan, que destaca como o Slow Fashion não é um descritor de velocidade, pois quando falamos sobre excesso de descarte, que é realmente o ponto mais visível do impacto gerado pela indústria da moda, não podemos esquecer que junto com esse ponto existe outras questões envolvidas.

“Quando você olha para uma roupa, tudo aquilo são pedaços de natureza, foram consumidos inúmeros recursos naturais para que aquela roupa fosse feita, e ela vai passar por um período de produção, mercantilização, consumo, ou seja, uso e descarte. Então a gente não tem só o problema do lixo, a gente tem o problema que estamos comendo o planeta”, observa Lilyan.

Imagem: Martin Bernetti via Getty Images.

Segundo a especialista, o Slow Fashion vem com soluções práticas, mas o principal destaque é a proposta ideológica de reconexão, “O Slow Fashion propõe uma conexão do ser humano com o vestir e com a natureza. Uma conexão que fale em interdependência, então o Slow Fashion é muito mais um movimento de conscientização do que um movimento de mudar a indústria têxtil”, explica.

O relatório A New Textiles Economy: Redesigning Fashion’s Future lançado em novembro pela Ellen MacArthur Foundation, com o apoio da estilista Stella McCartney, revela que por ano 500 bilhões de dólares em roupas são descartadas e que quase nunca são recicladas.

“O mais importante nesse ponto é que o “slow” vai trazer uma conscientização maior a respeito do outro, seja o outro o solo, o rio, ou seja o outro o trabalhador das cadeias têxteis”, conclui Lilyan Berlim.

A mão de obra escrava é outra questão dessa indústria. De acordo com a Fundação Walk Free e dados do Observatório Digital da Escravatura Trabalho no Brasil, apontam que entre 2003 a 2017 houve cerca de 35 mil resgates de pessoas em situações de trabalho escravo no Brasil, sendo o setor da indústria têxtil um dos mais responsáveis por essa estatística. Em 2020, 178 mulheres foram resgatadas de oficinas em São Paulo exercendo esse tipo de trabalho.

Nossa conscientização sobre o que estamos consumindo, é o que pode mudar essa realidade. É difícil seguir um padrão mais consciente em meio a atual realidade econômica do país. Porém, precisamos procurar saber os valores das marcas, no que elas acreditam, quais são os tipos de tecidos utilizados para a fabricação das peças e como é feita essa produção. Não são só os valores das roupas que devem ser levadas em conta, e sim, os nossos valores como seres humanos.

Por Letícia Zamboni (Estagiária)

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