As moedas sociais já são uma realidade no Brasil e foram implementadas em algumas cidades da Região dos Lagos e próximas: Maricá, Arraial do Cabo, Cabo Frio, Iguaba Grande e Saquarema são algumas delas. Essa alternativa, à moeda oficial, tem o objetivo de possibilitar as transações financeiras, dentro de determinada localidade, fazendo com que o dinheiro circule na própria comunidade impulsionando a economia solidária.
O Banco Central do Brasil permite a circulação de moedas sociais, emitidas por Bancos Comunitários, desde que a circulação seja apenas local em que sejam implantadas e o valor baseado na moeda Real (R$).
O Portal Costa do Sol conversou com alguns gestores dos municípios, para apresentar como tem funcionado a iniciativa em cada cidade:
Maricá – Moeda Mumbuca

Começamos a jornada pelo município pioneiro, que implantou a moeda Mumbuca, em 2013, através da Lei n° 2.448. Hoje o programa é referência nacionalmente e internacionalmente e atende 20.018 famílias de Maricá, totalizando 42.409 moradores.
Em entrevista, o secretário de Economia Solidária de Maricá, Adalton Mendonça e a subsecretária, Laura Costa, destacaram que entre os diferenciais do projeto na cidade, está o conceito de “universalização”.


A moeda social tem cobertura em todo o município e não apenas em alguns bairros e o todos os integrantes da família receberem o auxílio, não somente a família como um todo. O valor para cada integrante é de 200 Mumbucas.
Para ter direito ao benefício, o morador precisa estar inscrito no CadÚnico – Cadastro Único da União, o registro nacional de famílias em situação de vulnerabilidade social. O beneficiário tem que ser morador de Maricá há pelo menos três anos, e a renda da família ser de até três salários mínimos.
“Todas as pessoas que, há época, necessitam, com a base nos critérios do CadÚnico feito em 2017/2019, foram acolhidas. O que representou um percentual de 26% da população de Maricá”, explicou o secretário de Economia Solidária, Adalton Mendonça.
Nos últimos dois anos a cidade teve um grande crescimento populacional por conta da pandemia. Por esse motivo o município está planejando um grande recadastramento da população, para poder obter novos números, mais precisos, e levantar as necessidades sociais dos moradores.
A responsabilidade fiscal pelo recebimento do benefício fica a cargo das mulheres, que são em sua maioria chefes de família. As condicionalidades para receber a moeda, são as mesmas do CadÚnico: as crianças devem estar na escola e a vacinação em dia.
O município também criou outros programas ligados à Moeda Social, que foram implantados no período da pandemia. O Programa de Auxílio ao Trabalhador, para as pessoas em situação de MEI, motoristas de aplicativos, feirantes e autônomos e demais profissionais que foram prejudicados economicamente. E o Programa de Amparo ao Trabalho que financiou, junto ao empresário e comerciante, metade do salário do funcionário:
“Em Maricá geramos trabalho durante a pandemia. De acordo com o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), do Ministério da Economia, a cidade teve um crescimento de 15,45% nos postos de trabalho. A renda básica não é só “dar” dinheiro para quem precisa, é também impulsionar a economia, fazendo o dinheiro circular e possibilitar que comerciante contrate um trabalhador local ao invés de demitir”, frisou o secretário.
Entre os gastos dos beneficiários em primeiro lugar está a alimentação e em segundo a compra de remédios. Durante a pandemia Maricá foi uma das 5 cidades, no Brasil, que não registrou casos de insegurança alimentar, pessoas passando fome ou “com possibilidade” de passar.
“O grande objetivo da gestão municipal é que toda a população participe do orçamento municipal”, destacou o secretário da pasta.
“No início do projeto fizemos um levantamento dos comércios que queriam aceitar a moeda. Na época alguns ficaram receosos, porém uns do que aceitou, foi um “sacolão” de pequeno porte. Com o passar do tempo ele prosperou e se tornou um hortifrúti e hoje é um grande supermercado”, destacou a subsecretária Laura Costa sobre a transformação econômica no comércio.
Hoje Maricá possui mais de 12 mil comércios cadastrados no Banco Municipal Mumbuca, que é uma instituição comunitária que gere a moeda e é independente da Prefeitura, possuindo CNPJ e direção própria.
Só no Programa Renda Básica da Cidadania (RBC) a moeda injeta mensalmente R$ 8,4 milhões na economia da cidade.
Segundo os gestores, a verba da Moeda Social vem do orçamento municipal, que é a soma dos tributos, benefícios e serviço de royalties de petróleo. A principal garantia para continuidade dos programas é o Fundo Soberano feito a partir da arrecadação dos royalties de petróleo. Mesmo a cidade deixando de receber os royalties de petróleo, o Fundo Soberano garante a manutenção do programa juntamente com outras ações de desenvolvimento em longo prazo como crescimento da agricultura e do turismo.
O modelo de economia solidária da cidade tem sido modelo em todo o Brasil e também para cientistas sociais estrangeiros, que vem buscar no exemplo do município uma base para ser implantada em diversos países. Entre as ações integradas, também se destacam as hortas comunitárias e familiares, projeto de erradicação do analfabetismo e o Mumbuca Futuro: aulas de empreendedorismo popular, finanças solidárias e economia solidária no contraturno escolar.
Segundo os gestores, Maricá, já possui um longo trajeto de continuidade de governos com uma mesma visão social de distribuição de renda. São mais de 14 anos de gestões, o que possibilitou montar uma grande e forte rede de proteção social para os moradores.

“Acreditamos que possamos ter no futuro uma rede, começando pela nossa região Sudeste, no litoral norte, de Bancos Comunitários que se ajudem entre si como um consórcio e quem sabe um dia formar uma a “Rede Brasileira de Bancos Comunitários”. Hoje somos 130 bancos comunitários, sendo o Mumbuca o maior de todos, com 75 mil contas correntes”, explicou o secretário sobre a ideia levantada no último Seminário do Banco Mumbuca.
Finalizando a entrevista o secretário, Adalton Mendonça, citou alguns conceitos apresentados no livro “Vamos Sonhar Juntos: O caminho para um futuro melhor”, do Papa Francisco:
“No futuro, ou vamos dar bolsas de renda básica, cidadania e auxílio recomeço ou vamos ter uma quantidade gigantesca, bilhões de pessoas passando fome, pois não haverá trabalho para todos. Outra saída seria a diminuição da jornada de trabalho, para que outras pessoas possam se empregadas e terem renda e o direito de comer”, concluiu sobre o objetivo da economia solidária.
O comerciante Alexandre de Souza falou sobre a sua opinião com relação à moeda: “Ajuda bastante, tanto o comerciário, quando as pessoas que tem o crédito do Mumbuca. Porém eu vejo algumas pessoas aqui, que ao meu entender, desnecessariamente tem esse tipo de renda, eu acho que essa renda poderia ser distribuída melhor”, ressaltou.

Já a moradora Rosanea Alves disse: “Recebo a Mumbuca há três anos. Esse valor me ajuda muito, pois não tenho outras rendas no momento. Agora mesmo estou indo para o mercado comprar legumes, frango e frutas”, ressaltou a moradora de Maricá.


Arraial do Cabo – Gira Renda Cabista

Arraial do Cabo atua com o Gira Renda Cabista, que é um programa de distribuição de renda que atende 1500 famílias atualmente. Essas famílias recebem 200 reais mensais que podem ser gastos somente em comércios locais que são cadastrados no programa.
O recurso é repassado aos beneficiados por meio de um cartão. O programa foi implantado em julho de 2021, atende todos os bairros da cidade, mas o maior índice de beneficiados está no distrito de Monte Alto.
Para o secretário de Desenvolvimento Social, Trabalho, Renda e Direitos Humanos, Wagner Lima, o maior objetivo do Gira Renda Cabista foi alcançado, que era garantir a alimentação das famílias em vulnerabilidade social e, consequentemente, fomentar o comércio local.


Para se inscrever no Cadastro Único, os interessados devem procurar o CRAS mais próximo de sua residência, portando documentos como identidade, CPF, carteira de trabalho, título de eleitor, certidão de nascimento ou casamento, declaração escolar (no caso de crianças em fase escolar) e comprovante de residência. Todos os membros da composição familiar devem apresentar documentação.
Cabo Frio – Moeda Social Itajuru

O Portal Costa do Sol foi recebido, em Cabo Frio, pela secretária de Assistência Social, Nilza Miquelotti e o coordenador da Moeda Social Itajuru, Adriano Brisola.

O Programa Moeda Social Itajuru foi lançado em outubro de 2021, com o projeto-piloto no bairro Manoel Corrêa. Inicialmente foram contempladas 500 famílias a localidade. Segundo a secretária, em março de 2022 foi feita a primeira expansão do programa, com a inscrição de mais 44 comércios e mais 500 famílias.

José Bonifácio Ferreira Novellino
Atualmente a Moeda Social já atende um total de 2.500 famílias, cerca de 12 mil pessoas, distribuídas em: Monte Alegre, Boca do Mato, Porto do Carro e Vila do Ar (março/2022); Maria Joaquina, em Tamoios (julho/2022); Tangará, Emaús e Parque Eldorado 3 (outubro/2022) e Sinagoga (dezembro/2022).
Ao todo, o programa possui 231 estabelecimentos cadastrados e aptos a receber os recursos da transferência de renda.
“Temos por regra só cadastrar pequenos comércios, pois a moeda tem o foco na economia solidária. São os “dois lados da moeda”, um lado é quem recebe e o outro lado são os pequenos comerciantes que também se fortalecem quando a moeda chega no bairro. Aumentam os empregos e o dinheiro fica no bairro. O valor é multiplicado pois ele circula no localmente”, destacou Nilza Miquelotti.
“No projeto piloto, feito em Manoel Corrêa, tinham alguns comércios praticamente falindo, e que hoje cresceram. Era um hortifrúti pequeno e hoje são mercearias e até já contrataram novos funcionários”, explicou Adriano Brisola.
O Programa também possui a parceria com a Casa do Empreendedor Municipal, que formaliza através do MEI e capacita os pequenos comércios, com apoio do Sebrae, atuando nesse processo e dando consultoria para negócios na internet e empreendedorismo.
Antes de lançar a moeda, em um novo bairro, é feito um grande levantamento para verificar as necessidades sociais. Os comércios são analisados e cadastrados e é dada “orientação” para que essa verba seja usada na própria comunidade.
Durante os estudos os assistentes sociais do município visitam as famílias e avaliam critérios como: número de moradores, idosos com necessidades de cuidado, portadores de deficiência, entre outros. Dentro das famílias as mulheres são prioritariamente as responsáveis pela gestão da renda.
Como exemplo, na expansão da localidade Sinagoga, foram contemplados 135 mulheres chefes de família, solteiras e com mais de três filhos; 23 pessoas com deficiência; 45 pessoas idosas; desse total, 152 famílias numerosas (com mais de 6 pessoas); e oito homens pais de família com mais de dois filhos.
O Programa começou com 200 Itajurus, que equivalem a R$ 200,00 e hoje são 220 Itajurus. A intenção do município é contemplar, futuramente, todas as comunidades em situação de vulnerabilidade social, chegando a um total de 10 mil famílias.
Até o momento, o programa já transferiu mais de R$ 4 milhões, incluindo uma recarga extra para os beneficiários de 13º da Moeda, em 2022. São R$ 600 mil reias mensais. Desse valor 80% são consumidos com alimentos, 10% farmácia e os outros 10% com serviços.
A moradora, Grasiele dos Santos Abrantes, de 30 anos, recebe a moeda e falou ao Portal: “A moeda veio em boa hora, está ajudando muitos moradores. Eu uso o benefício para comprar alimentos e gás de cozinha para minha família”, explicou.
O Programa Moeda Social Itajuru é subsidiado pelos royalties de petróleo de Cabo Frio. Todas a famílias cadastradas integram o CadÚnico – Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal. O morador também precisa estar cadastrado no CRAS de referência do bairro.
Segundo os gestores, um novo passo que está sendo implementado é o levantamento e acompanhamento das mães solos, para que elas possam participar de cursos de capacitação e tenham assistência como a elaboração de currículo e orientação para o mercado de trabalho.
“Durante a implantação do projeto piloto, recebi uma carta, juntamente com o cartão do benefício de um morador, agradecendo e explicando que ele havia conseguido um emprego e estava devolvendo para que outra pessoa pudesse receber a moeda”, esse foi um belo exemplo de consciência e preocupação com o próximo, relatou a secretária de Assistência Social, Nilza Miquelotti.
A Moeda Social Itajuru é gerida pelo Banco Social, do Instituto Edinheiro. O Banco foi contratado, através de licitação, e fornece a plataforma de gestão da moeda.
Mostrando o sucesso da iniciativa, em fevereiro, um grupo de pesquisadores da Suécia, do Rio e de São Paulo visitou Cabo Frio para conhecer o funcionamento da Moeda Social Itajuru.
Iguaba Grande – Moeda Social Caboclinho

O Programa Municipal de Transferência de Renda – “Moeda Social Caboclinho” – foi implantado no município de Iguaba Grande através da Lei Municipal n.º1403/2022, em dezembro de 2022, com a cobertura de todo o território municipal.
O programa realiza a transferência de renda, no valor de 120,00 caboclinhos, que equivalem a R$ 120,00, beneficiando atualmente 1.724 famílias devidamente habilitadas a partir da base de dados do Cadastro Único do Governo Federal e que estão em situação de vulnerabilidade social.
Entre os critérios, para habilitação das famílias, apresentados no Edital realizado no município foram: estar inscrita no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal com cadastro atualizado há pelo menos 2 anos; possuir renda per capta mensal até ½ salário-mínimo e residir no município de Iguaba Grande há pelo menos 3 anos.
Segundo a secretária de Ação Social, Cláudia Souza, o cadastro dos comércios e serviços é feito pela equipe da Secretaria Adjunta de Desenvolvimento Econômico e Urbano junto à empresa que ganhou a licitação e é responsável pela gestão da moeda.


O programa injetará, aproximadamente, R$3,9 milhões de reais anualmente, no comércio local, fomentando o desenvolvimento das empresas da cidade.
A Moeda Social Caboclinho também chamou atenção de pesquisadores da Fundação Getúlio Vargas e da Lund University, da Suíça, que estão realizando uma busca sobre moedas sociais e políticas de transferência de renda e vieram à sede, em Iguaba Grande, para conhecer a Moeda Caboclinho.
A visita, realizada em fevereiro, teve o intuito de expor o trabalho já realizado pelo grupo de pesquisadores, que esteve em contato com o programa de outros municípios e países. Além de analisar a Moeda Social Caboclinho, coletando dados que serão úteis para montar um modelo para outras cidades, analisou também, o desenvolvimento econômico e social que a Caboclinho impulsiona na população e na cidade.
Saquarema – Programa Moeda Social Saquá

O Programa Moeda Social Saquá foi criado, no final de 2022, através da Lei n° 2.189 com o objetivo de fomentar o desenvolvimento social e econômico, auxiliar no combate a evasão escolar, além de estabelecer meios de minimização da pobreza e incrementar a geração de emprego e renda no município. Hoje o município atende com cerca de 11.400 mil benefícios.
A responsável pela pasta é a Secretária Municipal de Desenvolvimento Social, Daniele Borges dos Santos Vignoli. O programa concede benefício no valor de R$ 300,00, pagos mensalmente, em forma de créditos e disponibilizados por meio de aplicativo de telefone celular ou cartão, que podem ser utilizados para compras em estabelecimentos comerciais credenciados no município.
Para participar do programa, operacionalizado pela Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social, é necessário residir na cidade há mais de cinco anos e estar inscrito no Cadastro Único do Governo Federal (CadÚnico).
Também é necessário estar matriculado no período noturno, em unidade escolar da rede pública de ensino, nos cursos de Educação de Jovens e Adultos (EJA) e nos cursos preparatórios para o Exame Nacional Para Certificação de Competências de Jovens e Adultos (Encceja). Pessoas cuja família também esteja inscrita no CadÚnico, ou que apresente os requisitos necessários para inscrição, também podem se cadastrar.
A primeira carga do cartão, no valor de R$300,00, foi realizada no dia 05 de janeiro de 2023. E as recargas serão feitas, sempre, no dia 05 de cada mês.
As gestantes e pessoas com deficiência beneficiados com o cartão receberão o acréscimo de R$ 100,00, igualmente pagos mensalmente, que também poderão ser utilizados para compras em estabelecimentos comerciais credenciados, localizados no município.
Saquarema está realizando novos cadastros do dia 20 ao dia 31 de março.Os documentos necessários para cadastro são: (originais e cópias) do RG ou qualquer documento com foto, CPF e Comprovante de Residência (comprovando cinco anos de moradia em Saquarema). Qualquer dúvida ou esclarecimento, o morador deve procurar uma equipe do CRAS de referência do seu bairro. Essa nova inscrição é válida par quem já se inscreveu no CadÚnico até 24 de dezembro de 2022.
Região dos Lagos
Cada projeto realizado pelos municípios da Região dos Lagos tem suas particularidades, mas todos caminham para o mesmo objetivo: Implantar a Economia Solidária.
A moeda social vem como um resgate desta população que se encontra em situação de vulnerabilidade e risco alimentar. Ela é uma base para que essas famílias possam, através de projetos integrados, conquistar a autonomia financeira com dignidade.
A iniciativa também é fundamental no fortalecimento da economia local, dos pequenos negócios e geração de empregos.
Os demais municípios da Região dos Lagos, consultados pelo Portal Costa do Sol, não possuem ainda o programa.
Por Fernanda Guterres Santana
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