Renata Souza, deputada reeleita com a maior votação da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro é jornalista, doutora em Comunicação e Cultura, preta, feminista, nascida e criada no Complexo da Maré, Rio de Janeiro. Um fenômeno de potência feminina na luta pelos direitos humanos.
Renata é um exemplo de luta, de como transpassar barreiras sociais e econômicas para ingressar numa universidade, e de como usar a política como voz daqueles menos favorecidos e injustiçados, dos oprimidos e na luta por uma sociedade mais justa.
‘A sensação é de dever cumprido, mas há muito trabalho pela frente’
Portal Costa do Sol – Que avaliação você faz de sua reeleição, sendo a deputada mais votada do Rio de Janeiro e a terceira mais votada do Estado do Rio de Janeiro? Chegou a vez das mulheres, pretas e periféricas ocuparem o parlamento?
Renata Souza – Fui eleita em 2018 como a deputada estadual mais votada da esquerda, com 63.937 votos. Fui agora reeleita com 174.137 votos, como a mulher mais votada de toda a Alerj. Também foi muito relevante e significativo ter sido a parlamentar mais votada na Maré, onde nasci e me criei. O desempenho eleitoral foi o resultado de um trabalho coletivo intenso e cotidiano. Formulamos e apresentamos mais de 300 iniciativas legislativas, 39 leis foram aprovadas, realizamos dezenas de audiências públicas, centenas de reuniões com autoridades, com movimentos e organizações, e visitas a comunidades e municípios do estado, ouvimos, acolhemos e atendemos pessoas em situações de privação de direitos e sob situações de risco as mais diversas. Conseguimos ocupar a política com uma mandata que consegue impactar diretamente na vida das pessoas, especialmente as pessoas que mais enfrentam a violência do Estado, por encarceramento, genocídio, miséria, fome, falta de moradia, violência de gênero, entre outras formas de opressão, de exploração e de promoção das desigualdades. Conseguimos avançar um passo importante nessa ocupação da política pela mulher preta com esse peso eleitoral bastante expressivo. Esse movimento vem em crescente desde as eleições municipais de 2016, quando Marielle e Talíria foram eleitas vereadoras do Rio e de Niterói, entre outras por todo o Brasil, disse a deputada.
‘Em 2018, após o feminicídio político da Marielle, de quem eu era chefe de gabinete, esse crime nos exigiu uma resposta firme, de que não daríamos nem um passo atrás, de que não seríamos interrompidas’
Renata Souza – Então foi nessas terríveis circunstâncias que me tornei candidata em 2018, quando o PSOL elegeu três deputadas negras para a Alerj. Evoluir nessa ocupação transgressora de um espaço historicamente machista, branco e elitista vai nos exigir uma luta coletiva muito forte. Na próxima legislatura, mulheres ainda serão 21% dos 70 deputados e, entre essas, haverá apenas cinco negras. O fato é que há muito trabalho pela frente. Porque esses problemas só serão derrotados de forma definitiva quando houver uma mudança estrutural da sociedade para a superação do racismo e do patriarcado, para que a vida de toda e qualquer pessoa passe a valer igualmente e mais do que os interesses privados de alguns poucos, ponderou.
‘O Rio se consolidou nos últimos anos como o espaço da política do retrocesso e do atraso, além de governos corruptos que aumentaram as desigualdades sociais’
Portal Costa do Sol – Quais as suas principais propostas para o Estado do Rio de Janeiro?
Renata Souza – A nossa luta maior é por uma mudança estrutural dessa realidade injusta e desigual, atravessada violentamente pelo racismo estrutural e pelo patriarcado. Nosso desafio é transgredir dos limites do Parlamento, um espaço elitista, racista e machista, que se organiza predominantemente contra os nossos interesses de mulheres pobres, pretas, da favela, que se volta historicamente contra a nossa vida, os nossos direitos e a nossa dignidade. Nosso papel como parlamentar é, sobretudo, o de contribuir para o fortalecimento da organização negra e popular coletiva e da mobilização para as lutas necessárias para a superação do racismo estrutural e do patriarcado explorador e opressor. Seremos nós que vamos conquistar enfim a democracia real e a nossa efetiva liberdade, explica a deputada.
‘Nossa luta é pela própria sobrevivência do nosso povo, por comida no prato, saúde, educação e emprego para todos’
Renata Souza – Nesse sentido, vamos avançar e fortalecer as nossas frentes históricas de luta, na defesa radical dos direitos humanos, no combate intransigente ao racismo estrutural, às desigualdades e violências de classe, de religião, de gênero e de orientação sexual, ao desemprego, à miséria, à fome, à segregação e ao genocídio do povo negro e favelado. E óbvio, a juventude e a cultura também entram como prioridade das nossas próximas ações, porque quando não há investimento em cultura, a violência contra a juventude negra vira espetáculo, finalizou.
Por Renata Castanho
@renatasouzario
@instalerj
*É proibida a reprodução deste conteúdo