No comércio local de acessórios, as biojoias são artigos onde elementos naturais como sementes e escamas de peixes, dão origem a peças cheias de beleza, história e criatividade.
A criação das biojoias movimenta uma cadeia local de artesãs e pescadoras da Associação Apescarpgin, comunidade concentrada em Arraial do Cabo, situada no Parque das Garças e Gaivotas, onde a pesca artesanal gera renda para pescadores da região e auxilia no desenvolvimento econômico da sociedade.
“A finalidade da associação é englobar: biojoias; reaproveitamento do pescado; cozinha de beneficiamento; gastronomia; jovens aprendiz de pesca; grupos de trabalho com diretor, coordenador e subcoordenador. Por isso o nome é Apescarpgin, englobamos tudo e não jogamos nada fora, tudo é aproveitado”, explica o presidente da associação, José Carlos.
A valorização da pesca artesanal e o empreendedorismo sustentável tem auxiliado para que inúmeras comunidades tradicionais possam garantir renda própria para seus territórios, a partir da comercialização de produtos com degradação mínima ou zero ao meio ambiente. O incentivo a essas produções fomenta o desenvolvimento sociocultural da região, expandindo também o comércio local e o turismo.
De acordo com José Carlos, a pesca artesanal é responsável pela subsistência e geração de renda dos pescadores, mas viver apenas do pescado é um desafio constante para a comunidade. “Se o pescador só pensar na pesca, ele não sobrevive, porque nem sempre tem peixe. Se der sorte, ele traz 600 kg, 700 kg, 300 kg de pescado. Mas se ele não tiver sorte, ele vem só com o peixe para comer naquele dia. Então, o pescador foge muito para a segunda opção, que é ser pedreiro, carpinteiro, servente. A maior parte faz uma complementação, e a pesca é quase um hobby na vida dessas pessoas. Assim, eles acabam botando a pesca como segunda opção de renda”, observa José.
A associação de artesãos e pescadores nasceu a partir da necessidade de renda da comunidade de pescadores no momento em que a lagoa estava poluída. A partir disso, com o apoio da Prolagos durante esse período, surgiu a ideia de capacitar as mulheres da pesca artesanal para produzirem as biojoias como forma de renda.
“Quando a lagoa estava poluída recebemos o apoio da Prolagos com o auxílio do material para a fabricação das peças. Agora, o desafio é o período do defeso, mas quando não está no defeso, a gente vai estocando as escamas, barbatanas e caudas para quando chegar no defeso, não ter esse problema de ficar sem a matéria-prima para a fabricação das biojoias”, explica a diretora Angélica Cristina.
Há mais de 15 anos trabalhando com biojoias, a artesã, pescadora e diretora de biojoias da associação, Angélica Cristina, utiliza escamas de peixe, barbatanas, sementes de açaí e resíduos florestais para produzir e ensinar jovens artesãs a confeccionar biojoias como brincos, colares, pingentes e pulseiras.
A principal matéria-prima utilizada para a confecção dessas biojoias é a Tainha, um peixe local da Lagoa de Araruama. O processo de limpeza das escamas é feito pelos próprios membros da associação, assim, as peças são lavadas e tratadas para as artesãs realizarem a pré-produção e montagem.
“Além de artesãs, nós somos pescadoras também. Nós vamos lá, pescamos, usamos as escamas, nós usamos o rabo do peixe da Tainha, usamos a nadadeira também, tudo se torna matéria-prima para fazer brinco, colar. Então, a pesca artesanal, ela contribui muito para a nossa renda. A pesca artesanal é 100% atribuída à nossa fabricação de biojoias”, destaca.
Segundo o presidente da associação, a matéria-prima para a confecção dessas peças são feitas sem agressão ao meio ambiente e com o reaproveitamento de todos os resíduos. O professor e especialista ambiental, Eduardo Pimenta, explica a importância do cuidado ético e ambiental no uso de materiais marinhos na fabricação de biojoias, considerando a conservação dos sistemas aquáticos.
“A reutilização e certificação de que é um subproduto de consumo e de beneficiamento de pescado, é um dos mais nobres destinos. Então, a escama da Tainha da Lagoa de Araruama, a escama da Perumbeba também, mas é preciso ter atenção para que não se utilize espécies que são protegidas por lei de serem exploradas. O que não deve ser feito e deve ser atentado, é a retirada do Coral. O Coral é protegido por lei, então, não dá para você ficar retirando o Coral do substrato do fundo marinho, oceanográfico, para produzir biojoias, não é adequado e é crime”, explica.
Além do reaproveitamento do pescado, o que diferencia de outras peças de biojoias são as sementes. Pode ser nativa ou semente de açaí, mas as artesãs explicam que mais ou menos 80% a 90% dessas peças são parte da comunidade, da história e da cultura da região.
“Para a fabricação de algumas peças de biojoias, às vezes, utilizam miçangas, utilizam outros materiais, mas nós optamos por usar apenas materiais sustentáveis. A gente pega na restinga, ou é semente nativa, ou a gente cria nossas peças. A gente pinta com casca de cebola, casca de beterraba, produtos naturais”, destaca a coordenadora geral da associação, Luciana Oliveira Machado.
A produção de biojoia precisa ter pelo menos 80% da matéria-prima como semente. Dessa forma, por serem materiais orgânicos, as sementes também precisam ser tratadas para impedir a germinação, a deterioração e o crescimento de fungos e de bactérias. Portanto, elas necessitam de cuidados antes e depois da confecção das peças.
“A biojoia na vida da gente foi um complemento. Hoje na nossa associação, a gente capacita artesãs, a gente trabalha em comunidade gerando renda, a gente faz uma oficina uma vez por semana, todo mundo junto. Então, todo mundo se une e cada um leva sua peça, cada uma divide com a outra, se uma não pode ir na feira, a outra leva o material para vender, e, é assim, todo mundo unido e junto”, conclui.
Confira a galeria de imagens:
Por Letícia Zamboni
Fotos Thay Bonotto
Modelo Thamiris Carvalho