Os 80 anos de Paulinho da Viola e a serenidade de sempre

Paulo César Batista de Faria, o grande cantor e compositor Paulinho da Viola fez 80 anos e o tempo parece não passar para esse sambista de voz serena e suave.

Há 43 anos eu o encontrei na gravadora EMI-ODEON poucos dias antes de seus 37 anos comemorados no dia 12 de novembro. Eu iria completar 25 e estava prestes a entrevistar um já sambista consagrado que estaria lançando seu 11º disco, “Zumbido”.“Uma coisa é certa: este disco é o mais alegre que já fiz, tem uma esperança de vida”, diz ele.

Paulinho é um ‘gentleman’ no mais puro sentido da palavra. Um príncipe! E o gosto pela música veio predestinado praticamente de todo o ambiente familiar, com a forte presença de seu pai, o violonista César Faria.

Mais tarde, todas as tendências foram consolidadas com a convivência na casa de samba ‘Zicartola’, na Mangueira. “Eu convivi com Cartola, Nelson Cavaquinho, Zé Keti, Elton Medeiros e Ismael Silva e eles exerceram grande influência sobre mim”, diz o Paulinho.

Autor de grandes sucessos como ‘Sinal fechado’ e ‘Foi um rio que passou na minha vida’, o carioca Paulinho da Viola se queixava da invasão de música estrangeira no mercado. “Tocam música brasileira de madrugada e no horário nobre, o lixo do hit internacional”, reclamava.

‘Foi um rio que passou em minha vida foi cantada no Brasil inteiro’

A entrevista aconteceu na própria gravadora onde Paulinho chega com sua fala mansa, extremamente inteligente e educado. Alémdo trabalho ele falade seu segundo casamento, das cinco filhas (Atualmente são 7 ao todo com dois homens) e do seu grande prazer, ante os olhares curiosos: passar roupa,rs.

Vale lembrar que estávamos no auge da ditadura militar e todas as composições tinham que passar pelo censor antes de serem gravadas

– Gostaria de ter gravado há mais tempo um samba do Wilson Batista, mas infelizmente tive problemas com a censura. Considero ele o melhor sambista de todos os tempos, inclusive a música ‘Zumbido’ que dá título ao disco foi inspirada num personagem criado por ele. Ele retratava a vida da época em sua música e esse disco é uma homenagem a ele e a Heitor dos Prazeres que também foi uma figura excepcional, diz o cantor.

Você se considera um compositor popular?

-Eu tive exemplos de músicas que foram bem aceitas pelo público, como ‘Foi um rio que passou em minha vida’, que foi cantada pelo Brasil inteiro. Eu acho a minha música bem popular.

E há uma abertura de mercado para o compositor popular?

-Não, o que há é um fechamento. Há uma invasão muito grande de música estrangeira, o que atrapalha muito, pois é uma concorrência desleal e desigual. O que se toca de música estrangeira no horário nobre, o lixo do hit internacional…

Paulinho você conviveu durante muito tempo no ‘Zicartola’, bar do casal Cartola e Zica na Mangueira. Suas maiores influências vieram do Cartola?

– Exatamente. E todo o meu trabalho no início é muito influenciado por ele. Eu sempre cantei os seus sambas e convivi também com Zé Keti, Nelson Cavaquinho, Elton Medeiros, que também me influenciaram.

E num contexto geral, como você vê a nossa música hoje?

-Como toda arte popular, teima em resistir. Pelo que foi feito aqui já era para ter desaparecido. A música brasileira luta para se firmar, mas eu acho que ela vai conseguir. Muito difícil apagar da memória um Chico Buarque, Milton Nascimento, Caetano Veloso, além de vários novos artistas que estão surgindo como Djavan e Marlui Miranda. A música brasileira luta contra essa tentativa de afogamento das aspirações do nosso povo na música popular.

Como você vê a volta dos festivais de música?

– Acho que pode ser uma boa. O festival não pode deixar de estar ligado a interesses comerciais, mas o fato de premiar a primeira música, divide muito. É muito competitivo. Sou favorável a que os dez primeiros colocados sejam premiados. Atualmente não participo e não tenho o menor interessem em participar.

Paulinho de que lado você fica: a Elza Soares diz que não admite que uma pessoa fale de samba com um copo de wisky na mão, enquanto a Alcione diz que samba não é sinônimo de pobreza e cachaçada.

-Acho que não tem nada a ver. O samba tem muitas formas e maneiras e sofreu muitas influencias. Eu aceito todas as formas, não tenho preconceito, mas quero deixar claro o seguinte: eu me identifico mais com as formas mais puras, com o samba ligado a escolas de samba, apesar de minha obra ser bem diversificada. Quando fiz ‘Sinal Fechado’ –que as pessoas acham mais sofisticada- foi a única música bisada no meu show em 1973. O público já está aberto a todas as formas. Não sou radical. Adoro João Gilberto e ele nunca invalidou o Cartola, pelo contrário.

Paulinho por que você esteve afastado dos palcos cariocas?

-Porque viajo muito. E estou com dificuldades em conseguir um teatro e não gosto de planejar as coisas com muita antecedência. Mas, farei o show ‘Zumbido’ aqui no Rio e depois sigo para Salvador, São Paulo e um circuito pelo sul.

Um grande momento.

-Foi ver o meu samba ‘Foi um rio que passou em minha vida’ cantado por milhares de pessoas na Avenida Presidente Vargas. Foi muito emocionante.

Por Renata Castanho

Fotos de José Antonio Andrade Santos

@paulinhodaviola

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